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“Folhas do Anjo da Morte”

Por Lucas Maia


Foto: J. González (Florula Digital)

Justicia pectoralis. Foto: J. González (Fonte: Florula Digital)


A Justicia pectoralis  Jacq. (Acanthaceae), popularmente conhecida como chambá, tilo, anador ou trevo-cumaru é uma planta nativa da região tropical da América Latina, sendo frequentemente encontrada no México, Venezuela, Cuba, Jamaica, Equador e nas regiões norte e nordeste do Brasil. Utilizada tradicionalmente no tratamento de doenças do trato respiratório como asma, tosse e bronquite, a J. pectoralis encontra-se atualmente na Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse para o SUS.


Estudos fitoquímicos revelaram a presença de compostos como cumarina, umbeliferona e justicidina B, os quais parecem ser responsáveis pela atividade antioxidante, anti-inflamatória, antinociceptiva e relaxante muscular de extratos da planta. Além disso, foram observados, em roedores, efeitos sobre o sistema nervoso central, o que pode explicar o uso desta planta em rituais indígenas na região Amazônica.


Investigações etnofarmacológicas descreveram a utilização de folhas de J. pectoralis  (variedade botânica stenophylla Leon.) como aditivo e aromatizante em misturas alucinógenas utilizadas pelos índios Krahô, que a conhecem como mashi-hiri. Os xamãs desta tribo, conhecidos como wajacas, referem-se à J. pectoralis  var. stenophylla como “Folhas do Anjo da Morte” (bolek-bena), provavelmente devido à morte de três curandeiros desta tribo após o uso de uma potente preparação desta planta em forma de rapé (folhas secas trituradas e transformadas em um pó fino e aromático que é aspirado pelas narinas), que parece conter uma grande quantidade de triptaminas.


As triptaminas – alcaloides indólicos estruturalmente relacionados ao aminoácido triptofano – constituem um grupo de compostos encontrados em plantas, fungos e animais. Algumas triptaminas, como a serotonina e a melatonina, atuam como neurotransmissores e participam da regulação fisiológica em animais. Outras, como a psilocibina, presente nos chamados “cogumelos mágicos” do gênero Psilocybe, possuem propriedades alucinógenas em humanos. A dimetiltriptamina (DMT), curiosamente, ao mesmo tempo em que atua como um neurotransmissor em animais apresenta propriedades alucinógenas quando administrada em grandes quantidades e em determinadas condições em humanos. A DMT está presente em todas as plantas, sendo mais abundante em gêneros como Acacia, Mimosa, Anadenanthera, Chrysanthemum, Psy chotria, Desmanthus, Pilocarpus, Virola, Prestonia, Diplopterys, Arundo, Phalaris, dentre outros.


Frequentemente, a J. pectoralis var. stenophylla é encontrada em rapés preparados a partir da casca de diversas espécies de Virola. Possivelmente, a sinergia entre os compostos de Justicia e Virola, presentes nestas preparações, poderia explicar a potencialização dos efeitos psicoativos relatada pelos índios Krahô.


Índios Waiká moendo a resina solidificada de Virola theiodora para o preparo de rapé (Rio Tototobí, Brasil). Foto: R. E. Schultes (Fonte: UNODC - Bulletin on Narcotics, 1969).

Índios Waiká moendo a resina solidificada de Virola theiodora para o preparo de rapé (Rio Tototobí, Brasil). Foto: R. E. Schultes (Fonte: UNODC – Bulletin on Narcotics, 1969).


Referências:

  1. Horto Didático de Plantas Medicinais do HU/CCS/UFSC < http://www.hortomedicinaldohu.ufsc.br/planta.php?id=210&gt; (acesso em 11/03/14)

  2. Lorenzi, H; Matos, FJA. Plantas Medicinais no Brasil: nativas e exóticas. Nova Odessa, SP: Instituto Plantarum, p. 37-38, 2002.

  3. Rodrigues, E; Carlini, EA. Plants with possible psychoactive effects used by the Krahô Indians, Brazil. Revista Brasileira De Psiquiatria 28(4): 277-282, 2006.

  4. Stafford, Peter (1993). Psychedelics Encyclopedia. Ronin Publishing. p. 321.


Artigo publicado originalmente no Boletim Planfavi nº29.

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